«Só Podem Estar a Brincar connosco!»

«Só podem estar a brincar connosco, não é?» Foi assim que o blog Keep Talking Greece comentou o post que aqui traduzimos no Facebook. Refere-se a algumas das propostas apresentadas pelos credores, e o misto de espanto e raiva é fácil de explicar: nenhum governo as poderia aceitar, porque nenhum governo pode condenar o seu povo à fome e à miséria. Neste caso, à perpetuação da fome da miséria causadas por cinco anos de austeridade profunda.

Foi um choque, na terça-feira à noite, quando algumas das exigências austeritárias dos credores foram divulgadas pelos jornais. Faziam parte de um projeto de texto que o presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, entregara ao Primeiro Ministro Alexis Tsipras durante o encontro de emergência em Bruxelas, numa tentativa de chegar a um acordo entre as duas partes. Dá a ideia de que o autoproclamado amigo da Grécia se rendeu à ideia, partilhada pela Alemanha e pelo FMI, de impor a continuação da austeridade rígida, com as mesmas medidas duras que já haviam exigido, em 2014, ao anterior governo. O plano inclui a exigência de medidas no valor de três mil milhões de euros, só para o resto de 2015, algo que nenhum governo poderia aceitar, ao fim de cinco anos de austeridade da mais severa. Os credores exigiram medidas no valor de dois mil milhões e meio ao governo da Nova Democracia com o PASOK, que oferecera algo abaixo de um milhão de euros, e as negociações chegaram ao fim, sem sucesso, em novembro de 2014.

Deixo em baixo uma lista das exigências absurdas dos credores, juntamente com uma explicação e comentários sobre o respetivo impacto.

Duas das medidas chocantes exigidas pelas instituições são:

* Subidas exorbitantes no IVA sobre medicamentos, para 11 por cento (atualmente, está nos 6,5 por cento), e 23 por cento na eletricidade (atualmente está nos 13 por cento).

* Acabar com as prestações sociais para pensionistas e deficientes com rendimentos muito baixos (EKAS).

A subida do preço da eletricidade teria como consequência um aumento do preço de todos os produtos.

A subida do preço dos medicamentos iria aumentar ainda mais a pressão num país onde já tanta gente deixou de tomar a medicação necessária em 2012, quando desceu a comparticipação do estado nos medicamentos com receita médica.

Mas os credores, sobretudo o FMI, acham que o IVA nestes dois bens essenciais é uma fonte garantida de receita, já que tanto as farmácias como Empresa Pública de Energia (DEH) passam faturas, e não podem «enganar» o IVA.

No que diz respeito às prestações sociais para pensionistas e deficientes mais pobres, relembro só que a exigência tem feito parte das listas dos credores nos últimos anos. Calcula-se que o estado gaste cerca de cem milhões de euros por ano com o EKAS.

Os credores exigem ainda:

* Cortes nas pensões, principais e complementares, num valor de 1,8 mil milhões de euros, e com efeito já a partir do mês que vem, i.e., julho de 2015.

Segundo o WSJ, a proposta é de «reduzir a despesa com as pensões já em julho, o que se traduz numa poupança de entre 0,25 e 0,5 por cento do PIB este ano e 1 por cento no ano que vem.»

Em termos concretos, isto significa uma redução total de 2,6 mil milhões de euros em 2015 e 2016 — menos 8,8 por cento em comparação com 2014.

Trata-se de um corte nas pensões horizontal e indiscriminado, sem ter em conta se o pensionista trabalhou 40 anos ou optou por uma reforma antecipada, ao fim de 15 ou 25 anos de trabalho.

* Acabar com as reformas antecipadas o mais rapidamente possível.

Esta medida atingirá sobretudo pessoas com deficiência e os desempregados mais velhos, num país onde um quarto da população é desempregada de longo termo.

* Acabar com a redução de 30 por cento na sobretaxa, o chamado «imposto de solidariedade», que foi imposta pelo anterior governo ND-PASOK, no ano passado.

Famílias com um rendimento anual entre os 12 mil e os 50 mil euros passarão a pagar 2 por cento, em vez dos atuais 1,4 por cento. Os rendimentos entre os 50 mil e os 100 mil euros passam a ser taxados a 4 por cento, em vez dos atuais 2,2 por cento.

Outras medidas incluem:

* Privatizações na Empresa Pública e Energia o nos aeroportos regionais.

* Ficam excluídos despedimentos em massa na administração pública, mas o governo grego não pode anular as anteriores medidas de austeridade relativas a questões laborais, como o aumento do salário mínimo e a negociação coletiva.

Quanto aos excedentes primários, ou o que sobre das despesas com o serviço da dívida, os credores oferecem:

* 1 por cento para 2015

* 2 por cento para 2016

* 3 por cento para 2017 

* 3,5 por cento para 2018

É muito provável que a proposta dos credores contenha mais «coisas fofinhas», mas sem qualquer referência ao crescimento ou à anulação da dívida.

É uma proposta absurda para um país que sofre de recessão há cinco anos, um plano sem sentido com o único objetivo de continuar a sangria dos gregos, um disparate tremendo que tornaria impossível que a Grécia algum dia pagasse a dívida.

Ao fim de quatro meses de negociações, sai uma proposta que o governo grego nunca poderia aceitar, sobretudo no que diz respeito aos cortes nas pensões e nas prestações sociais, ou o aumento do IVA nestas duas categorias. E não é porque aceitar medidas tão penosas poderia causar um divisão no seio do Syriza; é mesmo porque medidas deste calibre não podem ser impostas a uma sociedade já em colapso económico, e porque o governo não pode obrigar os pobres a passar fome, cortar-lhes a eletricidade e fazer com que todos os produtos atinjam preços incomportáveis.

ktg

Imediatamente a seguir ao encontro com Juncker, o PM Alexis Tspiras disse aos jornalistas em Bruxelas que é necessário um acordo que não inclua medidas de austeridade extrema.

«Estamos muito próximos de um acordo quanto aos excedentes primários. Isso significa que todas as partes estão de acordo em prosseguir sem as intensas medidas de austeridade do passado.»

Mas também exclui a possibilidade de extinguir prestações específicas para os pensionistas mais pobres ou implementar alterações fiscais que implicariam aumentos da eletricidade na casa dos dez por cento.

«Na verdade, acho que as propostas que vão estar em cima da mesa serão as propostas do governo grego», acrescentou.

Na segunda-feira de manhã, a Grécia enviou aos credores uma proposta de 45 páginas. Na quinta-feira, Alexis Tsipras escreveu no Twitter que

«a nossa proposta continua a ser a única proposta realista e construtiva. As negociações vão continuar.»

De acordo com os média, o próximo encontro entre Tsipras, Juncker e Dijsselbloem está agendado para sexta-feira, dia 5 de junho, o Dia Zero, em que a Grécia deve pagar 300 milhões de euros ao FMI, ou arrisca-se a um «incidente de crédito.»

NT: Entretanto, a Grécia já anunciou que não paga ao FMI e recusa a proposta dos credores.

social-darwinism

PS: Até estou tonto.

O Original pode ser lido aqui.

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